Fragmentos da história de Arcille José Verdi: simplicidade e dignidade em quase um século de vida

Fragmentos da história de Arcille José Verdi: simplicidade e dignidade em quase um século de vida (Por Arnaldo 'Chico' Lamb)

Figura marcante do interior gaúcho, Verdi completaria 100 anos em abril de 2025. No entanto em 2024, partiu para morada eterna, contudo, deixou nesta vida terrena uma trajetória marcada por trabalho, caridade, fé, família e humildade

casal verdiNascido em Casca (RS), em 5 de abril de 1926 – embora registros familiares apontem que tenha vindo ao mundo um ano antes – Arcille José Verdi, um visionário a frente de seu tempo. Quem teve o privilégio de conhecê-lo relata fatos de uma vida rica em histórias e valores sólidos. Ao longo de 70 anos de casamento ao lado de Dona Oliva, construiu uma família: seis filhos (um deles já falecido), 11 netos e oito bisnetos (também com uma perda entre eles).

Uma jornada de coragem e superação
Ainda criança, Arcille deixou sua cidade natal com seus pais e familiares rumo à região de Frederico Westfallem (RS), em uma jornada de 28 dias, mais de 250 quilômetros. A viagem foi feita em carroças, acompanhada por porcos soltos e outros animais domésticos, até as margens do Rio Pardo, onde iniciaram uma nova vida. Ali começou uma caminhada marcada pela superação das dificuldades com humildade, esforço e muito trabalho.

A simplicidade sempre foi marca registrada de sua trajetória, mas nunca o impediu de realizar grandes feitos – a exemplo, o episódio marcante ocorrido no final dos anos 1960.

Na ocasião, percorreu a pé mais de 50 quilômetros até a cidade de Três Passos (RS), descalço e com um saco de estopa (juta) nas costas, com o objetivo de comprar um carro: a famosa "Rural Willys", veículo ideal para o interior de Capoeira Grande, distrito de Tenente Portela. Na primeira concessionária, foi subestimado pela aparência humilde. Seguiu então até outra revenda, onde surpreendeu o vendedor ao dizer que pagaria o carro à vista. Então, sobre a mesa, colocou o saco de estopa, que guardava o valor integral em dinheiro vivo para a aquisição da — "Rural Willys" — foi o primeiro da região de Capoeira Grande, distrito de Tenente Portela.

Discrição e caridade como princípioscasal verdi 2

O retorno para casa reservou-se outro episódio curioso. Arcille parou em uma festa comunitária à beira da estrada, deixou o carro novo distante e chegou a pé, descalço e com a calça arregaçada quase até o joelho. Discreto, sentou-se serenamente em um canto de uma longa mesa, e foi servido como um visitante qualquer com um prato de churrasco. Após a refeição, inclinou a cabeça em reverência de agradecimento, levantou-se e seguiu calmamente até o carro novo – que ninguém imaginava ser dele. O espanto tomou conta da comunidade ao descobrirem quem era aquele homem simples, porém digno e determinado.

Conhecido por sua honestidade, força de vontade e vida reservada, Arcille José Verdi tornou-se símbolo de dignidade, humanidade e caridade no meio rural. Esse veículo não era apenas um bem material, mas também um instrumento de solidariedade, ele socorreu muitas pessoas, levando-as até os locais de recursos médicos.

Laços com o Centro-Oeste

A influência de Arcille Verdi ultrapassa os limites do Rio Grande do Sul. Seus laços familiares e formadores alcançam cidades do Mato Grosso, como Água Boa, Canarana, Querência e Nova Xavantina.

Sua filha, Loraci Verdi, mudou-se para Água Boa em 1990, onde construiu uma carreira como professora e diretora de escolas, além de fundar a Escola Ação e Natação. Ela também teve uma forte ligação com a região, onde seus filhos nasceram e tiveram uma infância feliz e mantêm amizades até hoje.

A história de Loraci também está conectada às raízes familiares do Sul, especialmente à família Cecatto, que migrou para o Mato Grosso após a perda do marido, Vó Cecatto, que tinha 10 filhos.

O legado de Arcille

O legado de Arcille também pode ser visto no conhecimento transmitido aos jovens da região sul, muitos dos quais aprenderam suas primeiras lições práticas no campo com ele, operando tratores e colheitadeiras.

Hoje, esses mesmos jovens atuam em propriedades e empresas no Centro-Oeste, como os irmãos Patzlaff, na Fazenda Schneider, e Márcio Guerra — que nasceu nas terras de Arcille Verdi e, ainda jovem, foi trabalhar na Fazenda Roncador, onde também chegou a atuar como gerente de uma empresa de calcário. Laços familiares ainda conectam sua história a nomes como Clair Berte, do Hotel Fazenda Roncador, em Nova Xavantina.
Outras famílias que foram vizinhas no Sul e mantiveram laços muito próximos e fortes foram os Sangaletti, Silvestre, Giacomolli, Dalsoto, Itacir Pascoalli e a família Betio.

Um exemplo que permanece

A história de Arcille José Verdi é o retrato de uma geração que construiu o país com mãos calejadas, mas coração generoso. Sua vida, marcada por gestos silenciosos de grandeza, serve como inspiração para aqueles que acreditam na força dos valores, da honestidade e do trabalho justo.

Em tempos de transformações aceleradas, recordar a trajetória de homens como Arcille é reafirmar a importância de raízes sólidas e da dignidade em cada ato cotidiano — um legado que segue vivo em cada um que teve a sorte de aprender com ele. (Escrito por Arnaldo 'Chico' Lamb)

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